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O Metrô, episódio II

Ele não chega do nada. Sente-se sua presença ainda distante, ouve-se um urro mecânico, aquele som ou barulho que lembra uma avalanche corredor a dentro. É ele quem está chegando. Seus grandes olhos brilhantes iluminam todo o longínquo caminho escuro até que possamos ver sua face azul metálica. Sim, é ele. É hora de dar um passo a frente e cruzar a linha amarela.

Todos estamos esperando-o da mesma forma, confortáveis e despreocupados. Particularmente, não pensava em nada tão específico até o momento. Os outros eu já não sei. Nem imagino. Afinal, são tantas pessoas ali. Tantas vidas, tantas histórias, tantos caminhos diferentes e que se cruzavam diariamente dentro daquela fabulosa estação. São tantas pessoas... elas se relacionam e interagem ativamente. Por algum motivo ainda desconhecido, o comportamento humano ao vê-lo dobrando a pequena curva que antecede na estação Uruguaiana se torna mais agressivo. O conforto acaba e todos se espremem rigorosamente buscando posicionar-se estrategicamente para recebê-lo da melhor maneira possível. É lindo.

Quanto mais ele se aproxima, mais o solo torna-se inconstante, ele treme. Treme de medo, de respeito e admiração. E também pudera. É o senhor do subterrâneo que se apresenta. Robusto e intimidador. O som de seus freios ecoa por toda a galeria, construída especialmente para ele e somente ele desfilar. Nós somos meros espectadores.

Ao parar, o espaço entre uma e outra pessoa torna-se ainda menor. E não há fórmula física capaz de provar que existem possibilidades reais de tantas pessoas entrarem num lugar tão pequeno quanto aquele. Novamente, é lindo!

Poucos que cruzam este lugar mágico percebem a delicadeza do espaço, poucos realizavam quão simbólico era estar diante aquele grandioso colosso do movimento entre zona sul e zona norte. Ninguém se importa. Apenas eu: "É ele" - pensei - "Estou diante dele". O cavalo de ferro azul metálico.

E não tardou até as portas se abrirem.

Este post não tem título

Nem corpo. Nem texto. Nem sentido. Nem nada.
também quero ser dadá.

problemas com a subjetividade do poeta

Prof. Roberto,

Lhe escrevo para que me ajude com algo que há algum tempo vem me atrapalhando. Perdoe-me pelo contato através de uma carta improvisada, mas como não o encontrei no Instituto nas últimas duas semanas, não tive outra opção senão escrevê-lo, já que considero meu caso como uma urgência.

Prometo que serei breve e direta, professor. Eu preciso de um eu-lírico.

Se lhe pareceu sarcasmo ou insolência, acredite, não foi minha intenção. Tenho dolorosamente insistido em escrever histórias que não pareçam páginas de meu próprio diário. Ando falhando. Em meu último livro de contos, "Cartas anônimas num salão de balé", fiquei impressionada com o número de pessoas que me mandaram mensagens, quase todas tentando me consolar. 

Não me tornei uma boa escritora. Me faltam boas figuras e poder de criação. Meus personagens são rasos e sem gosto. Em poemas, escrevo sentimentos e passagens de minha própria vida. Ela nem é tão interessante! Penso que o motivo de meu razoável sucesso está relacionado à minha habilidade em ser vítima de minhas próprias palavras, mas com um certo carisma.

Preciso de sua ajuda, professor. 

Assim como a personagem principal do meu último livro também precisava, quando escreveu uma carta numa folha de papel ofício A4 como esta. Essa personagem, Rebeca, me persegue. Por mais que mude seu nome, nacionalidade, aparência física e temperamento, no fundo, ela sempre parece a mesma pessoa. Eu.

Preciso de um eu-lírico, professor. Espero que entenda. 
Preciso muito de um eu-lírico que-não-eu.

Cordialmente, 
sua aluna Amaranta.